jan 24, 2022

Acumulação de pensão por morte com aposentadoria no âmbito do RGPS

Marcos Vinicius Valotto
POR Marcos Vinicius Valotto
jan 24, 2022
Acumulação de pensão por morte com aposentadoria no âmbito do RGPS

Ainda é possível cumular o benefício de pensão por morte para cônjuge/companheiro, com benefício de aposentadoria após a E.C. 103/2019 (Reforma Previdenciária) no âmbito do RGPS?

A resposta para tal pergunta esta longe de ser apenas um sim, principalmente levando-se em conta o cálculo do benefício.

Para demonstrar a diferença, indico inicialmente a leitura do artigo anterior “Pensão por Morte, como era e como ficou após a E.C. 103/2019, para o dependente cônjuge/companheiro”.

Sabendo-se agora, que para óbitos ocorridos após a E.C. 103/2019 o cônjuge/companheiro sobrevivente tem direito a 60% do benefício que o falecido recebia (somando-se 50% da cota familiar + 10% por dependente – neste caso apenas o cônjuge/companheiro), passa-se a analisar como será realizado o cálculo para acúmulo da pensão por morte, com o benefício de aposentadoria.

Conforme demonstrado no artigo anterior, em casos de óbitos anteriores à E.C. 103/2019, era possível a acumulação de pensão por morte, com o benefício de aposentadoria em seus valores integrais (desde que a aposentadoria também tenha sido concedida em data anterior à E.C. 103/2019).

Ex: Aurélio era aposentado e recebia deste benefício o valor de R$ 3.200,00, e, Maria, era aposentada e recebia deste benefício o valor de R$ 2.200,00. Após o óbito de Aurélio, em data anterior à vigência da Reforma Previdenciária (E.C. 103/2019), Maria teria direito de continuar recebendo sua aposentadoria no valor de R$ 2.200,00, bem como receberia a pensão por morte de Aurélio no valor integral que o mesmo recebia de aposentadoria, ou seja, R$ 3.200,00, totalizando uma renda para Maria no valor de R$ 5.400,00.

Já, após a E.C. 103/2019, o cálculo para a pensão por morte houve alteração, conforme também indicado no artigo anterior, tendo o cônjuge/companheiro sobrevivente, direito a 60% do valor que o cônjuge falecido recebia de aposentadoria, mas, não para por aí.
Respondendo à pergunta constante no título da presente discussão, o inciso II do §1º, do artigo 24 da E.C. 103/2019, determina que é possível a acumulação de pensão por morte com o benefício de aposentadoria, sendo ambos concedidos no âmbito do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) “conhecido como INSS”, todavia, tal acumulação somente será possível na forma prevista no §2º do artigo acima mencionado.

O referido §2º do artigo 24, assegura a percepção integral do benefício mais vantajoso, e, de uma parte do outro benefício, aplicando-se redutores a este segundo benefício, de acordo com as faixas previstas nos incisos I a IV, do §2º mencionado.

Observem o que consta no referido artigo 24 da E.C. 103/2019:

Art. 24. É vedada a acumulação de mais de uma pensão por morte deixada por cônjuge ou companheiro, no âmbito do mesmo regime de previdência social, ressalvadas as pensões do mesmo instituidor decorrentes do exercício de cargos acumuláveis na forma do art. 37 da Constituição Federal.
§ 1º Será admitida, nos termos do § 2º, a acumulação de:
(...)
II - pensão por morte deixada por cônjuge ou companheiro de um regime de previdência social com aposentadoria concedida no âmbito do Regime Geral de Previdência Social ou de regime próprio de previdência social ou com proventos de inatividade decorrentes das atividades militares de que tratam os arts. 42 e 142 da Constituição Federal; ou
(...)
§ 2º Nas hipóteses das acumulações previstas no § 1º, é assegurada a percepção do valor integral do benefício mais vantajoso e de uma parte de cada um dos demais benefícios, apurada cumulativamente de acordo com as seguintes faixas:
I - 60% (sessenta por cento) do valor que exceder 1 (um) salário-mínimo, até o limite de 2 (dois) salários-mínimos;
II - 40% (quarenta por cento) do valor que exceder 2 (dois) salários-mínimos, até o limite de 3 (três) salários-mínimos;
III - 20% (vinte por cento) do valor que exceder 3 (três) salários-mínimos, até o limite de 4 (quatro) salários-mínimos; e
IV - 10% (dez por cento) do valor que exceder 4 (quatro) salários-mínimos.
§ 3º A aplicação do disposto no § 2º poderá ser revista a qualquer tempo, a pedido do interessado, em razão de alteração de algum dos benefícios.
§ 4º As restrições previstas neste artigo não serão aplicadas se o direito aos benefícios houver sido adquirido antes da data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional.
(...)

Assim, levando-se em consideração os mesmos personagens e valores do exemplo anterior, teríamos:
- Aurélio (aposentado), com benefício de R$ 3.200,00 e Maria (aposentada), com benefício de R$ 2.200,00.

Com o óbito de Aurélio, ocorrido após a vigência da E.C. 103/2019, a pensão por morte para Maria seria de 60% do benefício que Aurélio recebia, ou seja, no valor de R$ 1.920,00.

Deste modo, resta evidente que a aposentadoria que Maria recebe é superior ao valor da pensão, portanto, é assegurado à Maria a percepção do valor integral do seu benefício, vez que mais vantajoso, conforme §2º do artigo 24 acima transcrito, mas, como anteriormente destacado, será aplicado ainda os redutores constantes nos incisos I a IV do §2º, na pensão a ser percebida.

Para melhor visualização, o ideal é dividir o valor restante, referente ao segundo benefício, neste caso, a pensão por morte, da seguinte forma:

Valor do segundo benefício (pensão por morte) – R$ 1.920,00
Até o valor de 1 salário mínimo não se aplica redutores, logo, o valor mínimo da pensão a ser pago à cônjuge sobrevivente, será de 1 salário mínimo (na cotação atual 2022, corresponde a R$ 1.212,00).

Deste modo, descontando-se o valor de R$ 1.212,00, do valor da pensão (R$ 1.920,00), o que resta é o valor de R$ 708,00, que superam o valor de 1 salário mínimo.

Nestes R$ 708,00 será aplicado o redutor constante no inciso I do §2º mencionado, logo terá direito a 60% (sessenta por cento) do valor que exceder 1 (um) salário-mínimo, até o limite de 2 (dois) salários-mínimos), assim, 60% de R$ 708,00 corresponde a R$ 424,80.

Por conseguinte, aplicado o redutor, o valor a ser percebido por Maria, a título da pensão deixada por Aurélio será a soma de 1 salário mínimo com o valor final apurado após a aplicação do redutor em que se enquadrou o presente caso, ou seja, R$ 1.212,00 + R$ 424,80, totalizando R$ 1.636,80.

Percebam a diferença:
Antes da E.C. 103/2019:
Pensão de Aurélio – R$ 3.200,00
Aposentadoria de Maria – R$ 2.200,00
Total a ser recebido por Maria – R$ 5.400,00

Após a E.C. 103/2019:
Aposentadoria de Maria (valor integral do benefício mais vantajoso) – R$ 2.200,00
Pensão de Aurélio (60% de R$ 3.200,00 > R$ 1.920,00 > aplicado o redutor do inciso I do §2º do artigo 24, o qual se aplica no presente exemplo apenas ao valor que exceder 1 salário mínimo) – R$ 1.636,80.
Total a ser recebido por Maria – R$ 3.836,80.

Outros exemplos de cálculos para acumulação de benefícios após a E.C. 103/2019:
- Aurélio (aposentado) – R$ 7.087,22 (teto previdenciário atual - 2022)
Maria (aposentada) – R$ 3.800,00.

Aurélio vem a falecer, como ficaria a acumulação de benefícios para Maria?
Pensão de Aurélio (60% de R$ 7.087,22) – R$ 4.252,33.

Tendo em vista que este valor é superior ao benefício de aposentadoria que é percebido por Maria, é assegurado a esta a percepção do valor integral do benefício de pensão, vez que mais vantajoso que seu benefício, conforme §2º do artigo 24 acima transcrito, mas, será aplicado ainda os redutores constantes nos incisos I a IV do §2º ao benefício de aposentadoria de Maria da seguinte forma:

Até o valor de 1 salário mínimo não se aplica redutores, logo, o valor referente à aposentadoria de Maria sofrerá redutores, todavia, é garantido a esta que o valor mínimo desta aposentadoria será de 1 salário mínimo (na cotação atual 2022, corresponde a R$ 1.212,00), não sendo aplicado redutores neste 1 salário mínimo.

Deste modo, descontando-se o valor de R$ 1.212,00, do valor da aposentadoria (R$3.800,00), o que resta é o valor de R$ 2.588,00, que superam o valor de 1 salário mínimo, e ultrapassam o valor de 2 salários mínimos.

Neste caso, verifica-se que será aplicado o redutor constante no inciso I do §2º mencionado, tendo a mesma direito a 60% (sessenta por cento) do valor que exceder 1 (um) salário-mínimo, até o limite de 2 (dois) salários-mínimos), assim, 60% de R$ 1.212,00 corresponde a R$ 727,20.

Lembrando que o valor excedente a 1 salário mínimo era de R$ 2.588,00, descontando-se o valor correspondente a R$ 1.212,00 (valor que excede 1 salário-mínimo, até o limite de 2 salários-mínimos) que se enquadra no inciso I, resta ainda o valor de R$ 1.376,00, sobre o qual será aplicado o redutor constante no inciso II (40% (quarenta por cento) do valor que exceder 2 (dois) salários-mínimos, até o limite de 3 (três) salários-mínimos), do mencionado artigo.

Assim, terá direito a 40% (quarenta por cento) do valor que exceder 2 (dois) salários-mínimos, até o limite de 3 (três) salários-mínimos, ou seja, 40% de R$ 1.212,00, o qual corresponde a R$ 484,80.

Por fim, descontando-se do valor de R$ 2.588,00 o valor correspondente a R$ 2.424,00, nos quais enquadraram-se os redutores constantes nos incisos I e II, resta ainda o valor de R$ 164,00, sobre o qual será aplicado o redutor constante no inciso III (20% (vinte por cento) do valor que exceder 3 (três) salários-mínimos, até o limite de 4 (quatro) salários-mínimos) também do referido § 2º, ou seja, terá direito a apenas 20% deste saldo final de R$ 164,00, totalizando R$ 32,80.

Por conseguinte, aplicados os redutores, o valor a ser percebido por Maria, a título de sua aposentadoria será a soma de 1 salário mínimo com o valor final apurado após a aplicação dos redutores os quais se enquadraram no presente caso, ou seja, R$ 1.212,00 + R$ 727,20 + R$ 484,80 + R$ 32,80, totalizando R$ 2.456,80.

Deste modo, o valor final neste caso, somando-se a pensão de Aurélio e a aposentadoria de Maria, seria de R$ 4.252,33 + R$ 2.456,80 totalizando R$ 6.709,13.

Apenas a título de curiosidade, antes da E.C. 103/2019, Maria receberia integralmente os dois benefícios, cujo valor final seria a soma de R$ 7.087,22 (Pensão de Aurélio) + R$ 3.800,00 (aposentadoria de Maria), os quais totalizariam R$ 10.887,22.

É gritante a diferença. É um retrocesso social, mas, infelizmente é a lei vigente após a reforma previdenciária.

Obs.: em casos de óbito de segurado na ativa (não aposentado), primeiro é necessário calcular qual seria o valor da aposentadoria do mesmo, caso o falecido estivesse aposentado por incapacidade permanente (antiga aposentadoria por invalidez), para posteriormente calcular o valor da pensão, aplicando-se a cota familiar 50% + 10% por dependente, e, posteriormente verificar qual o valor mais benéfico (60% da pensão ou a aposentadoria que o cônjuge sobrevivente recebe), e, após, aplicar os redutores constantes nos incisos de I a IV do §2º do artigo 24, no segundo benefício, contudo, tal tema será tratado em uma nova oportunidade.

Referências:
AMADO. Frederico. Curso de Direito e Processo Previdenciário. 12ª edição revista, atualizada e ampliada. Editora JusPODIVM, 2020.

AMADO. Frederico. Reforma Previdenciária comentada. Emenda Constitucional 103/2019 e seus impactos infraconstitucionais. Editora JusPODIVM, 2020.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc103.htm Acesso em: 26 nov. 2021.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm Acesso em: 26 nov. 2021.

https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-seprt/me-n-477-de-12-de-janeiro-de-2021-298858991 Acesso em: 26 nov. 2021.


 

Marcos Vinicius Valotto
ESCRITO POR
Marcos Vinicius Valotto
Advogado inscrito na OAB/PR 80.912 e especializado em Direito Previdenciário em Arapongas/PR.
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